quinta-feira, 24 de novembro de 2011

'Militar não deveria falar em hipótese alguma' na sanção da Comissão da Verdade

Ex-ministro de Direitos Humanos considera que veto a discurso de familiar de vítima da ditadura se deve a medo descabido, mas não atribui atitude a Dilma ou a ministros.
O ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos Paulo Vannuchi lamenta o veto ao discurso de Vera Paiva, filha do ex-deputado Rubens Paiva, morto pela ditadura (1964-85), durante a cerimônia de sanção da Comissão da Verdade, ocorrida na última sexta-feira (18) no Palácio do Planalto.
Em conversa com a Rede Brasil Atual, Vannuchi indicou que não se pode atribuir nem à presidenta Dilma Rousseff nem aos ministros a decisão, que provocou irritação dos parentes de vítimas do regime. “O que ocorreu no ato foi aquela incapacidade que existe, e que não parte da presidenta, da ministra, mas do entorno, que não tem a segurança e o domínio que esses superiores têm, e recebem uma aura de paúra descabida, de pavor”, afirmou. Ele considera que o país evoluiu a ponto de não haver necessidade de temor, que precisa ser apagado mediante o diálogo claro para mostrar que não há intenções de revanchismo.
O cancelamento do discurso de Vera Paiva teria sido definido pelo receio de que a fala provocasse mal-estar nas Forças Armadas, que não estavam diretamente representadas no evento. “Militar não teria que falar em hipótese alguma. Quem poderia falar, em tese, é o ministro da Defesa. No caso, falou a presidenta da República, então ela está falando em nome de todos os militares e de todos os ministros”, diz Vannuchi.
O ex-ministro acredita que a escolha de Vera Paiva havia sido correta por representar uma das mortes de maior caráter simbólico do período autoritário. Paiva, que tinha atuação no Congresso contrária aos interesses dos repressores, foi morto em circunstâncias não completamente esclarecidas. Após a prisão, no começo de 1971, a esposa e uma de suas filhas, à época adolescente, foram presas e mantidas incomunicáveis durante doze dias. O corpo dele segue oculto.

Críticas

Ele pondera que, ao final dos dois anos, o relatório elaborado pela Comissão da Verdade permitirá passar a uma atuação concreta na punição de repressores. “O Brasil, se conseguir fazer essa Comissão da Verdade sem sentimento revanchista, dará uma demonstração cabal de seu amadurecimento institucional e vai certamente conduzir a questões concretas”, diz. Ele vê desconhecimento de quem defende que a comissão deveria ter papel punitivo, dado que cabe exclusivamente ao Judiciário esta função.
Vannuchi considera que há um processo “turvo” em torno do colegiado, que terá a incumbência de apurar as violações cometidas por agentes do Estado entre 1946 e 1988, período entre duas constituições, mas, ao que se espera, com ênfase nos crimes perpetrados entre 1964 e 1985. Ele acredita que não se pode comparar o projeto apresentado por ele durante o governo Lula àquilo que se tem como condição perfeita.  “O projeto ideal atrapalha aquele que passa pela vida política. A vida política não é a construção do sonho. É sonho atravessando o território concreto da realidade de forças políticas no Legislativo, no Judiciário, na mídia brasileira. O projeto é muito bom.”
O ex-ministro aponta que o texto enviado ao Congresso foi fruto da análise de 40 comissões da verdade ao redor do mundo e leva em conta os parâmetros definidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Vannuchi vê como suficientes os dois anos determinados para a apuração e o número de integrantes do colegiado, sete, uma vez que poderão ser firmados convênios com ministérios e com universidades federais para melhorar a capacidade de apuração.
Outra possibilidade defendida neste caso é a formação de comissões estaduais e municipais para investigar as violações localmente. “Isso cria um potencial infinito de técnicos para trabalhar. A dinâmica precisa ser de audiências. O estudo de material está franqueado, são centenas de publicações, milhares de notícias e de 8 milhões a 30 milhões de páginas no projeto Memórias Reveladas, sediado no Arquivo Nacional.”
A respeito da nomeação dos integrantes, que poderá ser feita em dezembro pela presidenta Dilma Rousseff, Vannuchi não se considera um bom nome porque não cumpriria com o princípio da isenção, dado que é um ex-preso político. Neste caso, também estariam excluídos  todos os integrantes das Forças Armadas. “No que eu pudesse ser ouvido, começaria com Paulo Sérgio Pinheiro”, opina. Pinheiro foi titular da Secretaria de Direitos Humanos durante o governo Fernando Henrique Cardoso, quando a estrutura ainda estava subordinada ao Ministério da Justiça. Atualmente, é integrante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ligada à OEA, e relator especial da ONU para os direitos humanos.
Por João Peres
Via Rede Brasil Atual

 

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Carlos Drumond de Andrade